segunda-feira, março 13, 2006

Meu querido, meu velho, meu amigo

Que me carregaste em cima de rodas durante dez anos.

Levaste-me e trouxeste-me para todos os melhores e piores momentos longe de casa. Guiaste-me para noitadas e passeatas e acolheste todos os penduras que se alaparam a ti, pelo karma de quem te conduzia. Estiveste lá desde a minha meninice de pré e recém condutora, em que te atascava impiedosamente em bancos de areia.

Atravessaste espelhos de água e tiveste os vidros arranhados pela gravilha com que levaste a velocidades pouco recomendáveis. Fizeste tantos buracos nos sapatos, que rompeste o record de furos, chegando a atingir a média de orifício e meio por dia. Perdeste as orelhas mais do que muitas vezes, porque ficavam coladas noutros semelhantes, ou porque tas roubavam, para vendê-las a oficinas de reputação duvidosa.

Apanhaste com choros pungidos, berros desalmados, palavrões, conversas profundas, cantorias desenfreadas, coreografias ao volante, maioneses e afins, ganhando o epíteto de santa viatura.

Passaste pela mão de inúmeros condutores de ocasião, sem nunca me deixares mal.

Tiveste o motor gripado, as escovas esgaçadas, o rádio destrambelhado, a antena roubada, a carroçaria corroída e a bateria finada. Até o motor de arranque se te emperrou, de tal modo que parecias possuído por um qualquer espírito das trevas.

Andaste por autoestradas e planícies, montanhas e praias, estradas nacionais e de terra batida, rectas e curvas, terras portuguesas e espanholas.

Vi há dias um corsa cinzento, da tua boa cepa, e fiquei de lágrima no canto do olho, inundada de recordações. Ah, mê grande Ernesto! Um grande bem-haja para ti, que já lá estás!

9 comentários:

cinderela disse...

Grande Ernesto! Nunca me desiludiste! Também te agradeço!

Rui disse...

Que fiquei de lágrima ao canto do olho... pobrezinho.

Isa disse...

mas que é feito do ernesto por deus...

Mipo disse...

'tadito... começou a perder dentes e a ficar com reumático... teve de ser substituído pelo XicoZé...

Anónimo disse...

Já merceia um louvor, o nosso finado amigo Ernesto... Viva ele!

Anónimo disse...

Pois que podia dizer que nas minhas mãos nunca se foi abaixo, mas seria mentira... Em tudo qt foi semáforo, da Rua de São Paulo à Miguel Bombarda/5 d'Ótubro...
Nesse dia estava possuído pelo espírito da gasolina, apesar de ser a gasóleo! ;-)
Ao Ernesto!!!
:-D

Junta-te ao clube disse...

Opá!!! Estás no coração de todos nós...

Ass: Gattaca

Neves dos Santos disse...

Das melhores crónicas de todos os tempos!! Tu, ao menos, escreves tão bem como falas...

bonifaceo disse...

A minha prima tinha um panda que também passou por algumas. Já não me lembro foi do nome que ela lhe deu.